quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Refugiadas iraquianas se prostituem para sobreviver na Síria

Refugiadas iraquianas se prostituem para sobreviver na Síria

Lina Sinjab
De Damasco



Dançarinas iraquianas em Damasco
Muitas das dançarinas iraquianas nos clubes sírios são adolescentes
Com seus letreiros em neon e decoração brilhante, dezenas de clubes noturnos se enfileiram nas ruas do bairro de Maraba, na capital da Síria, Damasco.

É para cá que homens de toda parte - é possível encontrar carros com placas não apenas da Síria, mas também do Iraque e da Arábia Saudita - vêm para ver jovens mulheres dançar.

A maioria das dançarinas são adolescentes e muitas delas são refugiadas iraquianas. Elas dançam pelo dinheiro que é jogado no palco.

Seguranças cercam as dançarinas, para impedir que sejam tocadas pelos homens da platéia. Mas esses guarda-costas também atuam como intermediários entre as mulheres e os clientes em busca de sexo.

Centenas de milhares de refugiadas iraquianas foram viver na Síria e na Jordânia nos últimos quatro anos, fugindo da violência e da instabilidade em que o Iraque mergulhou depois da invasão comandada pelos Estados Unidos, em 2003.

O desafio mais difícil é enfrentado pelas mulheres que têm de sustentar suas famílias.

As autoridades sírias e as agências de ajuda humanitária não têm números precisos, mas muitas mulheres dizem não ter outra alternativa além de trabalhar em lugares como os clubes do bairro Maraba.

Inocência perdida

Rafif é uma menina de 14 anos e aparência inocente, com o cabelo preso em um rabo-de-cavalo. Ele parece não compreender totalmente a gravidade da situação em que vive.

"Tenho três irmãs casadas e quatro irmãos. Todos eles estão em Bagdá. Eu estou aqui apenas com minha mãe e um irmão mais novo. Ninguém da minha família sabe o que eu faço aqui", diz Rafif.

Proibida de trabalhar regularmente na Síria, ela afirma que o dinheiro da família acabou e que sua mãe começou a procurar uma maneira de sobreviver.

Rafif diz que ganha cerca de US$ 30 por noite nos clubes (cerca de R$ 53), mas que chega a ganhar US$ 100 (cerca de R$ 178) quando algum homem a leva para uma casa particular. Ela não diz o que precisa fazer para ganhar esse dinheiro.


Uma mulher falou com a minha mãe, que concordou em me mandar para esses lugares. Nós precisávamos do dinheiro.

Rafif, 14 anos

"Uma mulher falou com a minha mãe, que concordou em me mandar para esses lugares. Nós precisávamos do dinheiro", diz Rafif. "Eu já fui presa por prostituição e mandada de volta ao Iraque, mas voltei para cá com um passaporte falso."

Nem todas as trabalhadoras do sexo entraram nesse mercado por escolha própria.

Nada, de 16 anos, diz que foi abandonada pelo pai na fronteira entre o Iraque e a Síria depois que um primo "tirou sua virgindade".

Cinco homens iraquianos levaram Nada da fronteira até Damasco, onde ela foi estuprada e vendida para uma mulher que a obrigou a trabalhar em clubes noturnos.

Atualmente, Nada está em um centro de proteção do governo sírio, de onde será deportada para o Iraque.

Exploração

O governo da Síria afirma que a polícia já prendeu meninas iraquianas com idades de até 12 anos que trabalhavam como prostitutas em clubes noturnos.

"Vemos um número crescente de mulheres que não conseguem pagar as contas no fim do mês e acabam mais vulneráveis a situações de exploração, como a prostituição", diz o representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) em Damasco, Laurens Jolles.

"Por causa da intimidação e da vergonha, muitas das vítimas do tráfico de pessoas e das trabalhadoras na indústria do sexo na Síria nunca serão conhecidas pelo governo ou pelas agências de ajuda humanitária", afirma Jolles.


Clube noturno do bairro de Maraba, em Damasco
Não há dados precisos sobre o número de prostitutas na Síria

As mulheres detidas pela polícia são enviadas a centros de proteção, de onde freqüentemente fogem, ou mandadas para a prisão.

"Imediatamente depois de chegarmos até elas, ou às vezes até mesmo antes, elas são libertadas da prisão sob fiança, geralmente pelas mesmas pessoas que provavelmente as forçaram a se prostituir", diz Jolles.

Muitas das jovens mulheres que deixam o Iraque na esperança de uma existência mais fácil e segura descobrem na Síria uma vida muitas vezes mais difícil ainda.

Em uma idade em que suas vidas deveriam estar apenas começando, adolescentes iraquianas como Nada sentem que já chegaram ao fundo do poço.

"Agora eles vão me mandar de volta para o Iraque. Eu não tenho ninguém lá e de qualquer modo temo por minha própria vida. Eu disse ao governo que não quero voltar (para o Iraque). A minha família me abandonou", diz Nada.

Fonte: http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2007/12/071204_iraqueprostituicao_ac.shtml

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